quinta-feira, 3 de março de 2022

Rondó Marinho


Tirei meu rondó do mar,
para dar a voz ao morto
ao absorto esquecimento,
e o sofrimento desse sal.

Os afogados na raia,
estão esperando que os vivos
joguem as redes na praia,
serem cativos sem mal.

Sentirem estarem vivos
por mais que a mentira doa
por mais que seja aflitivo
já soa como um bom final.

Tirei meu rondó do mar,
para dar voz ao morto
ao absorto esquecimento
e o sofrimento do sal.

As redes nesta praia brilham
iguais a fantasmas queridos
pescadores que partiram
os perdidos, sem sinal.

Tempestades no horizonte
clareando o mar escuro
vão tornando azul a fronte
de um conjuro divinal.

Tirei meu rondó do mar,
para dar a voz ao morto
ao absorto esquecimento,
e o sofrimento desse sal.

Se os vivos estão festejando
os mortos choram de inveja
o mundo está fervilhando
 troveja tal carnaval.

No carnaval se permite
a liberdade da morte,
das regras tudo se omite
na norte de ser  banal.

Tirei meu rondó do mar,
para dar a voz ao morto
ao absorto esquecimento,
e o sofrimento desse sal.

Morre na praia a liberdade
de fugir de um mundo  frio,
pois é cruel a verdade
como um brio artificial.

O mundo é limiar
de tudo que não seria
 tudo morre sem vingar
na poesia em tom infernal.

Tirei meu rondó do mar,
para dar a voz ao morto
ao absorto esquecimento,
e o sofrimento desse sal.

Balanço do mar é eterno
como as juras de paixão
o memento sempiterno
da ilusão fundamental.

Morre no mar esperanças
como morrem afogadas
as memórias das infâncias,
despregadas do varal...

Tirei meu rondó do mar,
para dar a voz ao morto
ao absorto esquecimento,
e o sofrimento desse sal.

E vou arrancando da orla
os afogados, os restos
tal nácar das conchas mortas,
brilho infesto em fé irreal.

E como um louco prostrado 
ao fluxo intenso da dor
de esquecer-se e abandonado!
Neste horror irracional...  

Tirei meu rondó do mar,
para dar a voz ao morto
ao absorto esquecimento,
e o sofrimento desse sal.
 

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